É uma tarde fria de outono.
Bigu deita no único cantinho que ainda bate Sol no quintal.
Apesar de não esquentar muito para ele já é o suficiente. Ele deita de barriga para cima, fecha os olhos e consegue relaxar, sentindo um minicalor aquecer seu corpo.
Já a Clotilde não consegue se aquecer tão fácil. Seu corpo miúdo não ajuda a proteger do frio.
Ela fica deitada, encolhida, embaixo do sofá, tentando se proteger do vento.
O mundo parece parado.
Porém, o silêncio é quebrado subitamente com passos apressados vindo de dentro de casa.
Clotilde, faz um esforço e se levanta para ver quem estava vindo.
Ela vê o Bernardo chegando apressado e com a dedo indicador encostando na boca, pedindo silêncio.
Ela não entende, mas obedece.
Bigu, que conseguiu relaxar bem com o mínimo de calor solar, parece em transe, e não percebe a aproximação do menino.
Bernardo chega perto do Bigu e diz baixinho:
– Eu preciso que vocês façam silêncio.
Apesar da voz ter saído baixinha, foi o suficiente para que Bigu se assustasse. E quase que saltando utilizando as costas como impulso, ele gira no ar e começa a correr para baixo do tanque. Local que ele sempre vai quando está com medo.
Enquanto corre para seu esconderijo, ele chora e late ao mesmo tempo.
Bernardo aumenta um pouco o volume:
– Shhhhhhhhhhhhhhhhhhhh! Fica quieto Bigu.
Clotilde balança a cabeça e da risada da cena.
– Nossa, que cachorro corajoso – diz ela – Por que você está pedindo para ficarmos quietos, Bedico?
Bigu, embaixo do tanque e atrás da maquina de lavar roupa, ouve a Clotilde, estica o pescoço e vê o menino.
– O Bernardo, tá querendo me matar do coração é?
Bernardo sorri, abre o braço para que os dois venham para perto dele:
– Vem ca, cachorrinhos. Mas, em silêncio hein, ela não pode saber que estou aqui.
Clotilde, ao ver que o menino sentou no degrau da lavanderia, mais que depressa sobe no colo dele, procurando se esquentar.
Bigu também se aproxima, lambe o rosto do menino, e senta ao seu lado, deixando seu corpo encostar no dele.
– De quem você ta se escondendo? – perguntou Bigu.
– De quem? Da monstra.
Bigu já fica em alerta.
– Monstra? Que monstra?
– Ué, a monstra do abr…
Antes que Bernardo pudesse terminar a frase, eles ouvem a porta da casa batendo e passos no quintal.
Bernardo diz:
– Ah não, la vem a monstra.
Bigu volta para debaixo do tanque e de lá mesmo começa a latir.
Bernardo coloca a Clotilde no chão e se prepara para correr.
Clotilde ameaça voltar para debaixo do sofá, para se proteger do frio e da suposta monstra. Mas, olha para o corredor e vê a Isabela chegando.
Ela rapidamente corre em direção da Isabela e pede colo. Isabela prontamente atende o pedido e pega a Clotilde no colo.
– Vem ca, Clotildinha, sua fofinha.
Bigu ouve a voz da menina e sai debaixo do tanque.
Bernardo está pronto para sair correndo.
Bigu diz:
– Ô Bernardo, por que você falou que a Isabela é uma monstra?
Isabela diz:
– Que?! Monstro é você, seu animal!
Clotilde sorri.
Bernardo se explica:
– É porque ela é a monstra do abraço. Toda hora ela quer ficar me abraçando.
– E daí? – pergunta Clotilde.
– E daí que eu não gosto.
Isabela fala irritada:
– Ai Bernardo, você é um chato.
Bernado, sem ligar muito para o que ela diz, sai correndo para dentro da casa.
Bigu se aproxima da Isa e diz:
– Não liga para ele, você pode abraçar a gente.
Isa, que já está com a Clotilde no colo, se abaixa e abraça o Bigu também.
Após um momento ela diz:
– Pronto, agora vou lá dentro tentar abraçar o chato do Bernardo.
Clotilde estranha:
– Mas, Isa, se ele não gosta que você abraça ele, por que você fica tentando o tempo todo?
Isa responde sorrindo:
– Porque eu gosto de abraçar ele, mas gosto mais ainda de encher o saco dele.
Os dois cachorros sorriem.
Isa diz, empolgada:
– Tive uma ideia! Que tal vocês e ajudarem a prender ele num canto e ai ele não vai ter para onde fugir, e aí eu abraço ele?
Os dois balançam o rabo concordando.
Isa sai saltitando e seguida por Bigu e Clotilde e entram na casa.
Lá dentro se ouve gritos, latidos e muita risada.